O Toque da Morte

06/06/2011 18:17

Oi :)

Esse é o conto que eu enviei para tentar participar da coletânea "Histórias Envenenadas", da editora Andross. Como, infelizmente, ele não foi selecionado, estou postando aqui para vocês. É o primeiro de terror que eu escrevo. Espero que gostem ^^

 

 

Terror. Um sentimento que poucos conhecem verdadeiramente.

Geralmente precede a morte; o grande pavor do fim, do desconhecido; pois isso é o que o ser humano mais teme. Posso confirmar com todo o meu ser.

Aqui está um pobre coitado que sofreu uma dura perseguição. Foi possível ver o medo crescer dentro dele aos trancos, cada nova onda de sustos o trazendo mais perto de seus instintos, tirando-lhe o pensamento lógico.

Eis como tudo começou.

Paulo Ricardo, era esse o seu nome, jovem de 27 anos que, pela primeira vez, levava uma virgem para cama.

Ele e sua parceira estavam naquele estágio estranho e confuso da relação em que se sabe que existe afeição, mas não se ela é o máximo que se chegará a sentir. Não tinham, porém, motivos para adiar o sexo.

Ignoremos os precedentes. Eles estavam na casa de Paulo. Já haviam começado; ele estava sobre ela, apoiando-se na cama com os dois braços, observando-a enquanto se movimentava devagar, tirando e colocando seu órgão molhado dentro dela. Ambos gemiam; ele por puro prazer e ela em um misto de gozo e dor. O movimento começou a ficar mais rápido, mais urgente, as feições dos dois mais maliciosas a cada segundo. Ela os segurava pelos cabelos, com o corpo se contorcendo, descobrindo cada detalhe do ato. Trocaram de posição. Ele conseguiu se segurar, contra qualquer expectativa, e prolongou o momento. Faziam sexo — sem amor, sem preocupação, só sexo. Agora estavam muito rápidos, ela sobre ele, gemendo cada vez mais alto enquanto pulava, colocava e tirava o pênis em seu interior. Cansou-se, e voltaram à posição primária, com uma carícia aqui e um beijo ali enquanto isso, mais uma lambida nos seios.

Não demorou muito depois disso para que ela chegasse ao ápice, soltando um grito, arranhando as costas dele e o puxando para mais perto, mais perto, sem se lembrar de que ele já estava dentro, suas secreções escorrendo e molhando tudo. Então ela deixou suas mãos caírem na cama, ainda ativa, mas sentindo seu corpo tremer, cansado, agradecendo e reclamando pelo esforço.

Ele gozou logo em seguida. Não fechou os olhos; fixou o olhar em qualquer coisa, as mãos dela, sem prestar atenção, somente aproveitando o líquido passar dele para ela, sendo impedido pelo preservativo. Ela sentiu a pressão final, quando ele a afundou sobre a cama para gozar com mais intensidade, quase a machucando com a força, empurrando-a para cima pela vagina e gemendo alto. Então, ele sentiu seu corpo querer cair, enquanto olhava para as mãos desfalecidas dela na cama, imóveis, e sentiu dedos tocando seu ombro...

Levantou-se rápido demais; deu alguma dor a ela, que o observava assustada, sem entender porque ele olhava para os lados, porque batia no ombro, porque tinha aquele olhar confuso no rosto.

Paulo sentia uma mão segurando seu ombro gentilmente, mas não havia nada ali. Mandou a moça embora; ela o fez, algumas lágrimas ameaçando fugirem de seus olhos.

Ele não entendia nada. Pensou que estava ficando louco. Tentou se distrair, não conseguiu. Foi dormir.

Acordou no meio da noite, com a mão apertando seu ombro com mais força. Iria procurar ajuda, com um amigo, um médico, qualquer um. Trocou de roupa, estranhando mais ainda como o tecido não mudara em nada a sensação.

Assim que colocou a mão sobre a maçaneta da porta, Paulo gritou, estridente, doloroso. Seu ombro fora deslocado; a mão o puxara para trás. Ele não iria sair daquele quarto.

Não era uma só mão agora; ele não conseguiu contar quantas eram. A do ombro continuava lá. Mais uma estava sobre seu peito, empurrando-o, e outra nos cabelos; algumas nas costas, no abdômen, nas pernas, entre elas. Muitas mãos, arranhando-o, fazendo-o ir para a cama. Ele estava desesperado, e quanto mais tentava fugir do invisível, mais apanhava.

Estava preso, e permaneceu assim, segurado pelas mãos. Foram cinco horas. Ele já começara a sangrar em alguns pontos.

Então ouviu um barulho na casa, e, logo depois, uma voz feminina alta e clara, vinda do outro lado da porta.

— Você não pode me ver.

Não houve tempo para resposta. Ele sentiu dois dedos, com unhas afiadas, entrarem em seus olhos, perfurando-os. Gritou, muito alto. Sangue escorreu por seu rosto, dois furos bem no meio de seus olhos. Ouviu a porta se abrir enquanto continuava a gritar e se debater, desesperado, louco.

— Você pode me ouvir. Quero que me ouça.

Gritaria irritante.

— Como vai me ouvir com todo esse barulho?

As mãos invisíveis abriram sua boca com força, e uma começou a entrar por ela, tentando alcançar sua garganta. Dois dedos conseguiram descer o bastante para arranhá-lo internamente, fazendo-o sangrar e vomitar. Quase se afogou com isso, mas as mãos o empurraram para que ele cuspisse tudo ao lado.

Sentiu a cama balançar com alguém que se sentava. Ele não conseguia emitir som algum.

— Tenho cabelos castanhos e lisos. Sou bela. Estou com um vestido rasgado, culpa de minha corrida até aqui. Faça a imagem em sua mente. E desculpe por ter demorado tanto, eu estava longe.

Paulo mal ouvia as palavras. Estava quase dominado pelo medo.

— Vim de uma família de bruxos. Magos, feiticeiros, chame como quiser. Morávamos em um belo reino, realmente encantado, cercado de magia por todo lado. Isso foi no século XVI; você nos conhece dos livros de História, ou talvez dos de contos de fadas. Existiam alguns feitiços tradicionais para nós; um deles era o da castidade, para mulheres. Era colocado assim que a menina nascia, e só seria retirado quando ela fosse se casar com alguém que os pais aprovassem. Até que encontrasse essa pessoa, a mulher seria virgem, e se tentasse ter uma relação antes disso, ela e o parceiro morreriam. O feitiço foi colocado em mim, como você já deve ter entendido.

Voz calma e paciente. As mãos arrancavam o que restou da roupa de Paulo.

— Porém, algo perturbou nosso ciclo de vida, algo que fez com que sumíssemos do mapa. Outro clã de magos nos atacou e matou quase toda a nossa população, incluindo meus pais. Como órfã, eu tive em mim um outro feitiço tradicional nascendo: o da imortalidade. A ideia era que eu não corresse perigo até que descobrisse como me livrar desse encanto. O outro clã sabia disso; tentaram matar os filhos antes dos pais, mas eu e alguns outros escapamos. Sempre fora proibido que a imortalidade fosse imposta em qualquer outro caso que não esse, a não ser com intervenção direta do rei ou da rainha. O único problema para mim era que, com o ataque, todos os nossos livros de magia, ou quase todos, se foram!

Paulo já estava petrificado. Furos nos olhos, garganta rasgada por dentro.

— Depois de pesquisar e procurar muito, descobri como retirar a imortalidade, mas não fiz isso. Estava concentrada no maldito feitiço de castidade. O único modo de retirá-lo era através de meus pais, meus pais mortos! Era um feitiço muito variável. Dependia completamente do que os pais consideravam alguém bom para sua filha, da mente deles ao impor o encanto. Tentei descobrir sozinha, mas o mais próximo que cheguei foram essas mãos invisíveis, para que eu possa tocar, e um modo de observar através de olhos invisíveis. Eu vi você com Mônica. Mas é uma faca de dois gumes; não posso ser vista e admirada por qualquer pessoa, ou sinto dores horríveis. E o toque através dessas mãos não é como o toque físico e real. Então me diga, Paulo, o que mais eu posso fazer senão continuar tentando quebrar o feitiço? O que mais, senão procurar uma pessoa que meus pais teriam aceitado, e infelizmente matando-a se ela não for a escolhida? Não é necessário que seja um homem, já que nosso reino nunca nos obrigou a isso. Podia ser qualquer um, desde que meus pais aceitassem. Eu prefiro homens, especialmente os que já tenham tirado a virgindade de alguma mulher; mas realmente pode ser qualquer um. E eu não morrerei com as tentativas, graças à minha imortalidade, é claro.

Paulo não podia chorar. Será que iria, se pudesse?

— Diga-me se não estou certa. Eu vi o mundo, perdi a pureza de minha mente, mas não de meu corpo. Eles não tinham o direito de fazer isso comigo. Não se pode viver na “meia inocência”, é doloroso demais! Não posso aceitar a morte sem antes ter conhecido o toque. Não posso aceitá-la enquanto não tiver saído da castidade, enquanto não tiver conhecido o único êxtase da vida! Como posso estar preparada para o que vem depois sem perder a meia inocência que me resta? ELES NÃO TINHAM O DIREITO!

Silêncio.

— Será que você é o certo?

Paulo sentiu um movimento na cama, e então um corpo feminino, aparentando ser jovem, que se colocava sobre ele. Tentou empurrar, mas as mãos não permitiram.

Ele sentiu o toque diferenciado de um dedo físico em seu peito, descendo suavemente até sua barriga e provocando-lhe um arrepio automático de prazer. Sentiu duas pernas o prendendo, e então dois seios sendo prensados contra ele. Estava nu; sentiu uma calcinha fina sobre seu pênis, amaciando-o e ficando cada vez mais molhada. Um gemido baixo, e o líquido escorria em seu órgão através da calcinha.

Veio a dor. Dor lancinante no peito, uma queimação, e ele impossibilitado de gritar. As mãos sumiram; ele ouviu um suspiro, e então o delicioso corpo de mulher também sumiu. Começou a se debater enquanto sentia seu peito queimar por dentro. Estava morrendo.

Agora sim, o terror. Ele sabia que iria morrer, sem ver, sem falar, sozinho com sua dor. Sua mente perguntava, não entendia nada. A previsão da morte certa.

Terror.

Eu saí da casa decepcionada. Já foram 343 homens mortos, contando com Paulo Ricardo, e 257 mulheres.

Meus pais morreram antes que eu soubesse quais eram seus critérios para escolher o meu parceiro ou parceira. Eu tinha quatorze anos. Começo a pensar que eles quisessem que eu permanecesse virgem até morrer, ou talvez que somente conhecendo o pretendente é que eles iriam aprovar a relação, o que agora é impossível. Mas irei continuar tentando; é meu único objetivo na vida.

Já mencionei que prefiro aqueles que conhecem minha história?

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